23/04/2007

A ética em Kant

Immanuel Kant (1724-1804) foi um célebre filósofo alemão, um dos mais importantes filósofos da época moderna europeia. As mais notáveis das suas obras são a Crítica da Razão Pura (sobre gnoseologia), a Crítica Razão Prática (sobre ética), e a Critica da Faculdade de Julgar (sobre estética).
Kant defende a existência de uma ética deontológica, uma ética do dever puramente formal, livre de qualquer conteúdo e independentemente da experiência. Sendo uma ética da intenção, apenas podemos avaliar moralmente as intenções com que as acções são praticadas e nunca as consequências das mesmas. Uma acção para ser avaliada moralmente tem de ser livre de qualquer constrangimento.
Só a boa vontade fundamenta o valor moral de uma acção. Uma vontade boa é uma vontade pura de qualquer determinação sensível, uma vontade desinteressada. Sendo portanto, o princípio do querer que torna a vontade boa, a moralidade é fundamentalmente uma questão de intenção. Mas o que é o querer? O querer não implica um projecto? Querer não será querer alguma coisa, a felicidade por exemplo?
O desejo de felicidade é natural no homem e este querer a felicidade torna a felicidade um princípio determinante da vontade. Este princípio enquanto inclinação natural presente em todos nós é subjectivo. Aquilo que nos torna felizes depende da diversidade das nossas necessidades e é diverso em diferentes sujeitos, por isso, não pode ser o princípio objectivo e universal válido para a vontade de todo o ser universal. Por outro lado se a felicidade fosse a verdadeira finalidade da natureza o instinto seria um princípio de determinação mais eficaz.
Kant pretendeu demonstrar que verdadeiramente moral é apenas a acção determinada pelo respeito pela forma da lei moral; só esta é o móbil da nossa vontade. Kant considera que as restrições e os obstáculos subjectivos longe de ocultarem o conceito de dever o põem em evidencia e pondo de parte as acções que são logo realizadas como contrárias ao dever examina algumas das acções que sendo realizadas em conformidade com o dever não são realizadas por dever, distinguindo legalidade de moralidade. Pode acontecer que, de facto, as nossas acções estejam materialmente conformes com o dever mas que nós as façamos por interesse.
"O comerciante que atende legalmente os seus clientes e não especula com os preços age de conformidade com o dever. Esta prática pode, ter em vista manter a clientela e o respeito pelo seu nome como comerciante. É em nome do seu bom-nome que o comerciante mantém uma prática honesta." (Kant, Metafísica dos costumes, Biblioteca filosófica, Coimbra, 1960, pp.15-37.
Neste caso Kant diz, o comerciante agiu unicamente em obediência ao dever, apenas agiu de acordo ou em conformidade com a lei permanecendo no pano da legalidade. A moralidade exige mais; exige que se actue unicamente por respeito à lei moral, por dever.
Agir moralmente é agir por dever, mas agir por dever não é o mesmo do que agir em conformidade com o dever. Kant distingue, assim, as acções por dever, das acções em conformidade ao dever e das acções contrárias ao dever.
As acções contrárias ao dever são todas aquelas que são erradas fazermos, como roubar, matar, mentir, etc. . São acções imorais e ilegais. Quando agimos em conformidade com o dever, fazemos aquilo que é correcto fazermos. Trata-se de uma acção legal mas pode não ser moral, por exemplo, não roubar no supermercado. Se a pessoa não o faz com medo de ser apanhada, a acção não é de todo moral. Se não roubar no supermercado porque é errado fazê-lo, independentemente das consequências, aí sim agiu por dever, ou seja, moralmente de forma correcta.
Se me encontrar em apuros será que poderei fazer uma promessa com a intenção de não a cumprir? Como posso saber com certeza se me é moralmente permitido fazer uma falsa promessa? - Kant diria «preciso só de perguntar a mim mesmo», se «ficaria satisfeito de ver a minha máxima (é ilícito fazer uma promessa falsa para sair de uma situação difícil) tornar-se lei universal (tanto para mim como para todos os outros).
Poderei dizer a mim mesmo: Toda a agente pode fazer uma promessa falsa quando se achar em dificuldade e não possa sair dessa dificuldade doutra maneira.» Facilmente reconheço que posso optar pela mentira mas não posso querer que a mentira se torne uma lei universal. Claro que a decisão de não mentir também pode resultar de uma prévia análise das consequências que o meu acto pode acarretar. Neste caso, a causa da determinação residirá nas consequências negativas e no prejuízo futuro que o meu acto poderá desencadear. Então estamos em presença de um acto legal mas não moral, realizado de acordo com o dever mas não por dever.
Rute Ribeiro

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